TJDFT anula ato que barrou empresa de usufruir de imunidade tributária do ITBI
Por: Mirielle Carvalho
Fonte: Jota Tributario
3ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios
(TJDFT) anulou um ato declaratório da Secretaria da Fazenda do Distrito
Federal que havia impedido a empresa JPG Participações Ltda de desfrutar do
benefício de imunidade tributária referente ao Imposto sobre Transmissão de
Bens Imóveis (ITBI). A decisão envolve a incorporação de três imóveis,
provenientes de cisão de pessoa jurídica.
No caso analisado pelo TJDFT, a empresa reivindicou o direito à imunidade
tributária relacionada à obrigação de recolhimento de ITBI, prevista no artigo
156, parágrafo 2º, inciso I, da Constituição. O dispositivo define que o imposto
não incide na integralização de capital ou em operações societárias, exceto
quando a atividade principal da empresa adquirente for compra e venda, locação
de imóveis ou arrendamento mercantil. A companhia defendeu ainda que o
indeferimento do direito à imunidade foi justificado em hipótese não prevista
na legislação, sob o argumento de que a inexistência de receita operacional
prejudicaria a análise da atividade preponderante. O Distrito Federal, por outro
lado, sustentou, em síntese, a inexistência de imunidade incondicionada.
Ao analisar o caso, a relatora, desembargadora Ana Maria Ferreira, entendeu
que não existia motivo que pudesse impedir a empresa de continuar a ser
beneficiada pela imunidade que lhe fora concedida anteriormente. Segundo ela,
estabelecida a hipótese de imunidade tributária diretamente pelo texto
constitucional, milita em favor da parte beneficiária a presunção de
enquadramento em seu espectro de abrangência, conforme entendimento
sedimentado pelo próprio Supremo Tribunal Federa (STF).
A empresa diz nos autos que usufruiu do benefício de suspensão da cobrança
do ITBI, concedida pelo Ato Declaratório 43/2019, pelo período de três anos,
em função da transferência da titularidade de três imóveis em operação de cisão
societária. Em fevereiro de 2022, alega que foi notificada a apresentar
documentos financeiros comprobatórios a fim de cumprir o mandamento do
artigo 2º do Decreto 27.576/2006.
O dispositivo mencionado estabelece que o ITBI incide sobre a transmissão
“inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, da propriedade ou domínio
útil de bens imóveis por natureza ou acessão física; a transmissão “inter vivos”,
a qualquer título, por ato oneroso, de direitos reais sobre imóveis, exceto os de
garantia; e sobre a cessão de direitos à sua aquisição, por ato oneroso, relativos
às transmissões referidas nos incisos anteriores.
Após a apresentação dos documentos requisitados em que eram detalhadas as
movimentações financeiras, bem como o resultado do exercício, a companhia
alegou que o benefício da imunidade tributária do ITBI foi cassado pelo ato
declaratório. Também apontou que as alegações pela cassação do benefício se
basearam unicamente no fato de não ter sido aferida receita nos exercícios
analisados, ditando que “a inatividade da empresa inviabiliza o cumprimento do
requisito da análise da preponderância e demonstra que não houve qualquer
intuito de desenvolvimento de atividade econômica”.
Em primeiro grau, juiz afastou imunidade tributária do ITBI
A empresa então interpôs um recurso ao Tribunal Administrativo de Recursos
Fiscais (Tarf), que foi indeferido em 2023, razão pela qual ela ajuizou a ação no
TJDFT para obter tutela jurisdicional para suspender liminarmente a
exigibilidade dos créditos tributários e, no mérito, anular o ato declaratório de
cassação que a impediu de desfrutar da imunidade tributária relacionada ao
ITBI. Em contestação nos autos da ação, o DF sustentou a inexistência de
imunidade incondicionada da organização.
Em primeira instância, o juiz Gustavo Fernandes Sales, da 3ª Vara da Fazenda
Pública do Distrito Federal, negou os pedidos feitos pela empresa. Na avaliação
do magistrado, o Distrito Federal possui competência cumulativa para a
cobrança dos tributos municipais, de acordo com a Constituição, possuindo
condições para cobrar o ITBI.
Além disso, Sales constatou que a fundamentação para do direito à imunidade
revela-se "de acordo com as demonstrações financeiras apresentadas na seara
administrativa, sobretudo as Demonstrações de Resultado, as quais indicaram
a ausência de receita operacional nos exercícios de 2017 a 2021".
Com a decisão do magistrado, a empresa interpôs uma apelação cível com o
objetivo de reformar a sentença obtida em primeiro grau. Na apelação, destacou
que a imunidade somente pode ser afastada "quando demonstrada a subsunção
do caso concreto à hipótese de exceção prevista no artigo 156, §2º, I, da
Constituição Federal". Ou seja, quando a receita da empresa provém do
desempenho de atividades de natureza imobiliária.
Também sustentou que, ainda que não fosse registrado o recebimento de
qualquer receita ou faturamento no desempenho de sua atividade empresarial,
ainda assim faria jus à imunidade tributária, já que lhe seria lícito organizar
patrimônio por meio de uma sociedade empresarial ou mesmo realizar uma
reestruturação societária. Já o DF defendeu que a falta de faturamento da
empresa impedia a identificação de sua atividade primordial e, por
consequência, a possibilidade de se analisar o enquadramento do caso à figura
da imunidade condicionada prevista naquela ressalva constitucional.
Postura do DF para cobrar ITBI apoiou-se em suposições desfavoráveis
ao contribuinte
Ao analisar os pedidos da companhia que buscava usufruir do benefício da
imunidade tributária referente ao ITBI, a desembargadora Ana Maria Ferreira,
da 3ª Turma Cível do TJDFT, entendeu, por outro lado, que o exame dos autos
não contempla evidências de que a recorrente tenha desempenhado, nos
últimos anos, qualquer atividade ligada à compra e venda dos imóveis
incorporados ao seu patrimônio em decorrência de cisão de pessoa jurídica.
"Ainda que sob a justificativa de se atribuir uma interpretação teleológica à
imunidade assegurada ao contribuinte, também não é possível inferir, da mera
inatividade da empresa – que não teria apresentado faturamento no último ano
–, a conclusão de que estivesse desempenhando atividade fora do espectro da
imunidade que lhe fora reconhecida tempos atrás", disse Ferreira.
Segundo a relatora, eventual dúvida acerca da natureza da atividade
desempenhada pela empresa beneficiada há de ser eliminada pela própria
autoridade administrativa no procedimento de lançamento, como assim define
o artigo 142 do Código Tributário Nacional (CTN). Ferreira ressaltou que,
como delimitado pela norma, é ônus da autoridade administrativa a
demonstração da presença de todos os requisitos imprescindíveis à
configuração do crédito tributário.
Assim, afirmou que a postura adotada pelo Distrito Federal se encontra
apoiada, apenas, em suposições e intepretações desfavoráveis ao contribuinte.
Nesse sentido, concluiu que, se a autoridade administrativa garante que a
empresa beneficiada desempenha atividade que se encontra fora do âmbito da
imunidade tributária que lhe é assegurada por norma expressamente prevista no
texto constitucional, cabe a ela demonstrar, em bases concretas, a veracidade
dessa informação.
Mateus da Cruz Brinckmann, advogado do escritório Barbosa, Lima, Cruz &
Nery e responsável pela defesa da empresa no caso, afirmou ao JOTA que a
decisão foi uma vitória importante para os contribuintes e privilegia a segurança
jurídica. Para ele, a insegurança vem das decisões que questionam essa forma
de imunidade de maneira arbitrária. "Você não pode questionar uma imunidade
com base numa interpretação subjetiva. Você tem que observar a norma de
maneira objetiva", afirmou o advogado.
O processo tramita sob o número 0702173-90.2024.8.07.0018 no TJDFT.